25 de fevereiro de 2011

Leve o dia leve

Antes de prosseguir a leitura, dê o play: Eliza Doolittle - Pack up

Se tem uma coisa gostosa de se admirar é aquele olhar evasivo do cotidiano cultivado por algumas pessoas. A capacidade de enxergar beleza na rotina e mudar o ângulo qual seja o lugar tornam os dias mais amáveis.

E vá lá, a rotina não é assim tão chata. O que manda é o jeito como escolhemos vivê-la. Muitas vezes eu me pego ranzinza no meio do dia por motivos bobos e quando vejo, eu poderia ter sido menos implicante com a temperatura bipolar, o tiozinho empacado na minha frente na escada rolante ou atraso no sistema do metrô. Isso se eu simplesmente entendesse que o segredo da caixa preta está na forma como a minha cabeça lida com o dia a dia. Sabe aquela de “pára o mundo que eu quero descer?” então...esqueça. Crie suas alternativas e reclame menos. Rotinices podem ter um sabor muito bom se soubermos prová-lo.

Ok, e daí então esse blábláblá todo?

Daí que dia desses achei um tumblr de uma fotógrafa, Bridget Fleming, que toca um projeto chamado Downtown from Behind. Ela tira foto por trás das pessoas andando de bicicleta pelas ruas do centro de Nova York e aproveita pra contar algo da vida dos seus personagens eleitos. Eu me apaixonei pelas fotos, pela ideia, pelo modo como ela consegue transparecer a simplicidade e criar um cenário novo naquele batido.

Um bom exemplo de como enxergar as situações com leveza.


  Bridget Fleming. Downtown from Behind.

Bridget Fleming. Downtown from Behind.

 Bridget Fleming. Downtown from Behind.

 Bridget Fleming. Downtown from Behind.

 Bridget Fleming. Downtown from Behind.

 Bridget Fleming. Downtown from Behind.


22 de fevereiro de 2011

Categoria fitness

Desde que abandonei meu saudoso ballet, lá pelos idos de 2003, venho aprendendo a lidar com este ambiente tosco peculiar que é uma sala de musculação. A verdade é que eu sempre tive um metabolismo muito acelerado e responsável por alguns apelidos carinhosos de infância como magrela, carne seca, Olívia Palito e coisas legais do gênero. Por isso, ao invés de sentar no canto de um sofá e praguejar contra os palhaços contratados de festa de criança que me davam esses nomes, resolvi fazer algo por mim e adentrar neste tedioso fantástico mundo do condicionamento físico.

As academias, por exemplo, têm um público que varia desde os frequentadores frenéticos, passando pelos preguiçosos esforçados (como eu), até os visitantes esporádicos. Adaptando o que havia disponível ao que os meus cambetchos em forma de perna necessitavam, procurei algo conivente com este metabolismo de papa-léguas que vos fala. O que encontrei? A musculação, um ambiente interativo repleto de máquinas de tortura e seres intrigantes que fazem barulhos estranhos. Com o passar dos anos eu fui variando entre visitante esporádica e freqüentadora, digamos assim, média - não são sinônimos, acredite em mim. Depois de um tempo e algumas mudanças, pude notar que, salvo o canal de rádio, certos detalhes não mudam quer você esteja no interior das minasgeraisuai ou na capital da Garoa.
Toda sala de musculação que se preze tem uma base de  público dividido em algumas categorias, a saber:

Categoria mamãe sou forte: corresponde a, aproximadamente, 70% do target. Esta casta é dominada pelo gênero masculino, embora algumas mulheres insistam em participar dela para a vergonha alheia da classe. Sua preponderância é notável já que seus indivíduos podem ser identificados a uma distância considerável porque, geralmente, carregam uma corrente de prata reluzente no pescoço e vestem um abadá de cores luminosas. Eu tento conter as lágrimas toda vez que vejo um abadá sendo usado como roupa, mas às vezes é difícil. O tipo é dotado de um amor próprio tão incrível que não me surpreenderia se a cama fosse um espelho só pra dormir abraçado com ele mesmo, assim como o teto e as paredes do quarto. Passam a maior parte do dia na saleta em questão, exercitando seus músculos, orgulho inveterado da classe. Bom mesmo seria se exercitassem o cérebro na mesma medida. Para as que têm gosto pela categoria, mas não por academia, não se preocupem! Eles podem ser encontrados em alguma rave com um pirulito de morango na boca e óculos de sol Oakley ou imitações tortas (mais provável).

Categoria ursinhos carinhosos: Possuem vasta semelhança com a categoria acima, mas têm um diferencial marcante que os obriga serem classificados de forma distinta: querem ser seu amiguinho! É aquele cara que adora te ajudar a trocar o peso de um aparelho, ele quase te persegue pra trocar todos os pesos, conversar sobre amenidades, temperatura do dia, comentar o quanto você está sumida e cumprimentar com beijinho no rosto – pra mim essa é pior parte, as pessoas estão suadas, qual a razão em fazer isso? Eles não estão interessados em saber se você quer papo, puxam conversa sem saber o seu nome e mesmo que recebam respostas monossilábicas ou um sorriso amarelo, continuam o monólogo como se nada tivesse acontecido. E por mais que se trace um roteiro estratégico de aparelhos para desviar deles, a tentativa é falha, eles surgem do limbo sempre com alguma conversinha xarope daquela. Alguns são mesmo carentes e não sobrevivem sem o beijinho de boa noite da mamãe. São os ursinhos carinhosos legítimos. Outros só querem se fazer passar por tal porque acreditam que assim as pobres moças vão se afeiçoar por eles. Uma lástima. Pras mulheres, claro.

Categoria cansei de ser nerd: é uma categoria curiosa e engraçada. Composta por aqueles que foram magrelos (oi, carapuça) e esquisitos a vida inteira, mas se cansaram da realidade injusta. Daí preparam seu kit de guerrilha e vão à luta. Eles podem ser identificados usando tênis branco e meia preta, bermudão, óculos de grau ou camisas de numeração três vezes maior. Alguns evoluem até demais reposicionando seu produto no mercado para a alegria do público feminino. Por outro lado, há os que jamais abandonam o seu posto geek e estão muito bem assim, obrigado. Desconfio que calculem friamente o tempo que vão levar fazendo a sua série versus tempo necessário pra terminar o download da última versão daquele programa de edição de HTML. São simpáticos e com humor sarcástico, só precisam tomar cuidado pra não serem acometidos pela síndrome dos ursinhos carinhosos. O vírus pega fácil.

Se você não se encaixou em nenhuma destas categorias, calma, não fique triste, há inúmeras outras por aí ao ar livre e até mesmo nas calorosas academias. Se você gosta de se mexer ou só finge mesmo, como eu, vai encontrar um habitat com facilidade, os atletas de fim de semana não me deixam mentir. Se não, o sofá com cobertor é sempre um lugar convidativo, só não adianta vir com lamúrias dos efeitos catatônicos.

14 de fevereiro de 2011

Google Street Art View

Quando o Google lançou o Street View, eu torci o nariz. Não pra tecnologia em si, mas para o uso lascivo que logo iria surgir. Torci porque acredito que o limiar entre tecnologia e privacidade muitas vezes se perde no meio do exibicionismo social.

A ressalva são as formas como podemos usar as oitavas, nonas e décimas maravilhas desse mundão geek sem porteira. Entre tantas cenas toscas, engraçadas, curiosas e dignas de vergonha alheia captadas por este decente país afora, uma empresa resolveu enxergar oportunidade e lançar uma plataforma digna de inovação.

A Red Bull montou o Street Art View, um site participativo que permite ao usuário ver as artes de rua pelo mundo e também cadastrar alguma que o próprio conheça. Ideia simples e alinhada ao valor da marca.

Exposição mundial de arte. Custo zero.

Dá para escarafunchar muita coisa aí e, dentre os autores, achei Keith Haring por acaso. Bem, talvez não por acaso se levarmos em consideração o seu reconhecimento no mundo da arte gráfica que eu desconhecia até então. A coincidência ficou mesmo por conta de eu ter visto uma exposição dele neste fim de semana quando perambulava à toa pela Paulista.

Mas voltando ao foco, não vamos ser hipócritas e dizer que um leigo ficaria horas aí fuçando todas as imagens, nem que eu quisesse, teria esse tempo. O cerne da questão é a iniciativa da marca em tomar partido de uma tecnologia recente e gerar conteúdo focado. Mandaram bembagarai.

Red Bull dá asas à imaginação. JB, Rio de Janeiro.

Mancebinho, não tô dizendo que o artista desta obra aí tomou um Red Bull pra turbinar a imaginação, porém é quase inevitável que o nosso cérebro faça uma associação da arte à ideia que temos da marca... catch the point!

De vexame alheio à ação de marketing. O limite da versatilidade de uso está nos olhos de quem não vê. 

13 de fevereiro de 2011

De domingo

Responda rápido: como você se sente vendo Zorra Total sábado à noite?
Né, não dá. Já sabemos os efeitos colaterais danosos causados ao corpo humano e por isso nosso cérebro evita essa situação da mesma forma que nos avisa parar de passar o dedo na chama da vela: “isso não vai acabar bem ”.

Agora, demos mais um passo e caímos no Domingo. Pense rápido, qual outro programa de TV vem a sua mente? Sim, é dele que estamos falando. O programa do Faustão me desperta o mesmo alarde que o do Zorra Total. Pra mim, ambos funcionam como um aviso de abismo sem retorno. É simples, direto e fatal. Você já está ferrado. Poderia ter evitado, mas está lá absorto pelo caminho.
A diferença é que, cá na realidade, antes da placa de abismo, há várias outras indicadoras pra te possibilitar mudar o rumo. A escolha fica a cargo do motorista, mas o espada ignora. 

Viabilidade econômica de produto de massa à parte, o que me faz torcer as tripas com esse tipo de programa é a mensagem subliminar entre as filmagens, dizendo algo mais ou menos assim:


E aí mané, beleza? Então o seu dia de descanso chegou depois da semana inteira ralando no trabalho pra pagar a conta de energia elétrica. Haha você é um grande idiota, parabéns. Fique aí mesmo deitado assistindo toda essa baboseira e comentando como vida alheia lhe parece ser bem mais interessante que a sua. Você até poderia estar fazendo algo mais interessante, mas a predileção pela banalidade fala mais alto. Melhor manter a cabeça no stand-by a ter que colocar a engrenagem pra funcionar .  Talvez tenha mais gente aí por perto né, também assistindo, e vocês só se falam para trocar comentários sobre o programa. Que convivência de merda. Amanhã cada um retorna ao seu trabalho ou estudo reclamando como não sobra tempo pra nada. Bem, vocês fazem por merecer . O que nós achamos ótimo, pois assim a audiência por aqui continua correspondendo às expectativas do nosso ROI. Caso vocês descobrissem o que há aí do lado de fora da janela, a brincadeira iria acabar. Então que tal mais um intervalo comercial pra você poder ir ao banheiro? Até o próximo bloco!

Pessoal entretido

Esse daí foi o lado endiabrado da minha consciência fazendo as vezes por aqui, porém há de se dizer que o inconformismo com a bunda no sofá ataca até o anjo de candura que neste corpo habita. Mas calma, não vamos culpar o pobre sofá. O meio pouco importa, o que vale é o uso que se faz dele. 

Não é necessário fazer de cada fim de semana uma vivência espetacular. Afinal até um certo cara descansou no sétimo dia depois de tanta labuta civil. Ficar em casa e jogar as pernas pro ar é uma delicia merecedora. O problema é quando, junto com as pernas, você joga todo o resto pro ar. As boas conversas, os chamegos preguiçosos, as mesas de café da tarde com a família ou de buteco com os amigos, como quiser. Tudo pro saco. Cada um acomodado num canto da sala olhando pra TV feito peixe de aquário, sem ter pra onde ir e achando que o mundo é aquilo mesmo. Nem um filmezinho pra contar história.

Eu já vi muitas vezes essa cena acontecer na minha realidade. E já fui coadjuvante também. Em todas as situações, há aquela sensação detestável de dia perdido. Mas com a percepção um pouco mais apurada, dá pra passar de espectador a protagonista e somar os domingos vividos no calendário.

8 de fevereiro de 2011

Ele que via

E então ele viu. Ele viu de uma só vez tudo o que já disseram. Tudo o que ela deveria saber. O que ela sabe e cisma em esconder. Nem precisou muito, bastou um olhar de lado e ele logo viu. Tampouco de espelho. Não ele. Talvez ela. Ele viu toda a graça e ele achou graça. Viu o sorriso, o jeito de mexer no cabelo. Logo ele que nunca tinha visto. Logo ele que pouco sabe. Ele viu e fez questão de mostrar, e ela entendeu o quão cega era, mas só fingia ver. Ele não estava nem aí. Ele via tudo muito simples, via melhor que quem já tinha visto. Ele não se gabava de si. Ele se gabava dela. Ela era demais. Ele achava que ela também via, mas nisto, somente nisto, ele estava enganado. Ele não via que ela não via até o momento de ele ver. Pena, ele se irritou. Mas ainda assim ele via além. E ele era paciente com ela. Ela não. Nem com ela nem com ele. Ela se perdia no emaranhado da sua cegueira. Ela não via o essencial, era invisível. Ela só sabia ver com os olhos. Logo ela que tanto sabe. Mas ele estava lá vendo todo o tempo.  Ele não se importava, só via. E o engraçado é que eles não se viam, só falavam. Como, então, ele podia ver? Mas ele sabia. Ele estava lá o tempo todo. Ele a via em outras sem vê-la. Só ela. E ela não via. Ela não sabia. Então começou a se cansar de ver. Ele estava vendo o que não queria, ficou tudo mais claro do que deveria. Ela queria tanto que ele visse. Ela não sabia. Ele viu tudo e começou a não ver mais. Ele viu tanto que se ofuscou. Ela não entendia. Ela queria ver. Ele não. E quanto mais ela tentava, mais ele se ofuscava. Ele já tinha visto demais. Ela perdeu a hora de ver. Ele a perdeu. Então eles se perderam uma última vez. Eles não viam mais nada. Daí ela entendeu. Ela viu. Ele passou para avisar que via. Ele passou como alguém que passava por ela para avisar que a chave ia cair do bolso de trás da calça. Ele avisou para ela não perder. Ele avisou para ela ver. Ele se foi. Hoje ela vê. E eles, não mais se vêem. Do mesmo jeito que nunca se viram.

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